A base de toda universidade: dados abertos sobre as ações de extensão na UFG em 2024
Dados abertos da Universidade Federal de Goiás explicam a operação dos projetos de extensão na instituição, iniciativas que são importantes ferramentas para a formação dos estudantes
Ana Luisa Freitas, Asafh William, Gustavo Martins e Renato Cândido

Estudantes do projeto de extensão "Brabo" no município de Jesus de Machaca, na Bolívia. Fotografia por Hayane Bonfim.
A extensão universitária é, na visão de Nilton José dos Reis Rocha, professor do curso de Jornalismo da FIC/UFG há 46 anos, e que ocupa o 8º lugar no ranking de professores com mais projetos de extensão cadastrados, algo que “nos salva” e nos “devolve à sociedade”. Esse pilar, indispensável para a construção de toda universidade, é essencial para a formação acadêmica de estudantes, promovendo um movimento ensino-sociedade
Acompanhe aqui o ranking dos 10 professores que mais realizam ações de extensão na UFG.
A análise dos dados abertos da UFG evidencia que as ações de extensão estão fortemente presentes na instituição, com um número total de 13.553 projetos cadastrados desde 2015. O grande desafio encontrado na operação das ações de extensão é o da permanência estudantil, uma vez que grande parcela dos estudantes da universidade não consegue se dedicar exclusivamente aos projetos.
Dados de extensão
A Universidade Federal de Goiás conta com um total de 13.553 ações de extensão contabilizadas desde 2015. Entre elas, 7 mil estão cadastradas como projetos, 4.884 eventos, 1.116 cursos, 321 prestações de serviços e 155 programas.
Tipos de ações de extensão realizadas nos últimos 10 anos, divididas em categorias como projetos, eventos, cursos, prestação de serviços e programa. Feito por Gustavo Martins com dados fornecidos pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFG).
Os projetos integram uma categoria um pouco mais ampla, pois dentro de um projeto é possível trabalhar com cursos, prestações de serviço entre outras coisas. Prestação de serviços é a oferta de trabalho que se encerra ali mesmo; O Curso tem um viés mais educativo e pedagógico e com uma carga horária contínua mas com um fim bem definido; Programa é uma articulação de vários projetos, é preciso ao menos 3 projetos relacionados para se constituir um programa. As ações de extensão, em sua maioria são coordenadas por professores, mas existem outras categorias que podem exercer as coordenações, como técnicos administrativos e até médicos residentes.
Quantidade de ações lideradas por servidores como docentes, técnicos-administrativos e médicos residentes. Feito por Asafh William com dados fornecidos pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFG).
Na UFG, o índice de conclusão das ações é alto, sendo maior que a de ações em execução, isso se deve ao acúmulo de ações durante os anos.
Situação de ações de extensão entre concluídos ou em execução. Feito por Asafh William com dados fornecidos pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFG).
Falando sobre as ações de extensão durante os anos, houve um pico de 2.001 ações no ano de 2018, quando as Universidades Federais de Jataí e de Catalão ainda faziam parte da UFG. Uma sequência de baixas nas ações se inicia em 2019, ano de início do mandato do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, que naquele ano promoveu um corte de 30% dos repasses de recursos federais para universidades e institutos.
Em 2020 a sequência de baixas segue e a pandemia do Covid-19 atinge todos os cantos do país. Com isso, a UFG decreta pausa das atividades presenciais, impactando fortemente nas ações. Até que, em 2022, as atividades retornam e mesmo com muito esforço e trabalho da comunidade acadêmica, a sequência de baixas continua em 2023.
Ao analisar os anos de 2024 para 2025, houve uma queda de 398 no número de ações. Vale destacar que o ano de 2025 ainda não acabou e os dados apresentados são referentes ao primeiro semestre do ano, o que pode explicar essa queda.
Ações de extensão executadas nos últimos 10 anos. Feito por Gustavo Martins com dados fornecidos pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFG).
As ações de extensão estão em diversas áreas do conhecimento, nas quais se dividem os cursos e as unidades presentes na UFG, setores como Ciências Humanas, Engenharias, Linguística, entre outras, compõem a grande gama de campos do conhecimento presentes na UFG.
Dentre elas, a área das Ciências da Saúde é a que mais realiza ações de extensão, seguida pelas Ciências Humanas e depois pelas Ciências Sociais Aplicadas. A porcentagem de ocupação dessas ações nas áreas de conhecimento está no gráfico a seguir

Porcentagem de ações de extensão realizadas de acordo com a área de conhecimento. Feito por Asafh William com dados fornecidos pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFG)
Quando se fala sobre financiamento, em números gerais, a área da Saúde também lidera o ranking, com 315 projetos financiados de forma externa, 641 com financiamento interno e 2.345 sem financiamento algum, sendo a área com maiores números nas três categorias e uma margem de distância dos outros colocados.
A Faculdade de Enfermagem lidera a lista de Unidades Acadêmicas responsáveis por ações de extensão com um total de 794 projetos. Logo em seguida vem a Faculdade de Medicina (752) e a Escola de Veterinária e Zootecnia (641).
Partindo para uma abordagem percentual, podemos identificar uma anomalia em meio à normalidade dos dados. A área de Ensino de Ciências e Matemática conta com apenas 16 ações sem financiamento, 4 ações com financiamento externo, e nenhuma com financiamento interno. A título de exemplo, a média de ações por área de conhecimento é de 1.355 ações, uma média muito acima das 20 ações totais da área de Ensino de Ciências e Matemática. Sendo assim, 80% das ações da área de Ensino de Ciências e Matemática não têm financiamento, e os 20% restantes delas têm financiamento interno.
Seguindo essa análise, a segunda área que mais recebe financiamento externo e, por consequência, a segunda que menos recebe financiamento interno é a área de Ciências Exatas e da Terra.
A área de Ciências Exatas e da Terra tem ações de extensão com 43,4% de financiamento externo e 56,6% de financiamento interno. Feito por Asafh William com dados fornecidos pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFG).
No lado oposto está a área das Ciências Biológicas, esta é a área que mais recebe financiamento interno e a que menos recebe financiamento externo.
A área de Ciências Biológicas tem ações de extensão com 75% de financiamento interno e 25% de financiamento externo. Feito por Asafh William com dados fornecidos pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFG).
A extensão enquanto formação acadêmica
Samanta Nascimento é estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e vivenciou a extensão acadêmica em diversas vertentes — seja em projetos, eventos ou por meio do Coletivo Magnífica Mundi. Para ela, a prática demonstra a importância desses momentos para além da sala de aula.
“Sempre gostei muito de ter algo pra fazer no curso, principalmente se for algo prático e foi isso que me motivou a entrar nos projetos que participo, ter a verdadeira experiência do curso, falar com as pessoas, entrevistar, fazer posts e conteúdos científicos para as redes. Coisas essas que nunca aprenderia com as matérias ofertadas”, pontua.
A estudante também defende que os projetos a fizeram se localizar dentro de sua graduação, descobrindo novos gostos e a aproximando de como seria a realidade dentro do mercado de trabalho.
“Foi graças a esses projetos que consegui me localizar dentro do curso, foi através deles que descobri o que gosto ou não e foi onde eu me encontrei também, através da educação midiática e educomunicação. Sinto que além de moldar minha visão de curso, moldaram minha visão de vida […] E foi mais a partir dos projetos de extensão que eu tive experiência pro mercado de trabalho. No curso mesmo, eu não tive essa experiência. Então foram os projetos que me deram essa formação, desde textos jornalísticos até textos científicos”, declara.
Como alguém que conhece a realidade da extensão, Samanta acredita que há melhorias a serem feitas através da universidade para que haja um maior incentivo para a participação dos discentes, seja por meio de divulgação ou também do aumento de recursos.
“Eu acho que falta a UFG incentivar mais essas ações de extensão, porque, na maior parte do tempo, a gente vê só os professores tentando manter os projetos sem apoio da faculdade ou da universidade. Eu acho que precisam de mais medidas que ajudem a manter esses projetos, seja com bolsas, recursos ou até mesmo divulgação, já que muitas vezes os alunos nem sabem da existência dos projetos”, finaliza.
Perspectiva Institucional
De acordo com Isaac Antonio Maciel Saraiva, servidor da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC), as informações utilizadas na planilha de Dados Abertos são extraídas diretamente do Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas (SIGAA) da UFG. Tendo como justificativa a escassez de projetos nos anos iniciais, 2015 e 2016, por decorrência do processo de implementação do SIGAA na universidade.
Os escassos recursos para os 13.553 projetos são majoritariamente direcionados a uma área específica, a da saúde. Para Isaac, essa discrepância é histórica e ocorre por uma relação hierárquica, uma vez que a área da saúde promove muitos mutirões e atendimentos. O problema é que isso gera um cenário onde as produções de outras áreas do conhecimento são invisibilizadas, tendo em vista que a diferença da quantidade de bolsas entre a saúde e os demais campos é de quase 300 bolsas. Isso coloca em risco a ideia de uma universidade plural e diversa.
Na tentativa de contrabalancear essa desigualdade e incentivar a extensão em todas as unidades acadêmicas, a PROEC adotou uma política de cota mínima no último edital do Programa de Bolsas de Ações de Extensão (PROBEC). O atual modelo assegura que todas as unidades acadêmicas da UFG possuam pelo menos duas bolsas.
“No último ano, no último edital do PROEC, o que a gente fez? A gente definiu que tenha mais ou menos 100 bolsas no total. 7 são para programas institucionais da PROEC e as outras 93 seriam divididas entre as unidades acadêmicas da seguinte maneira: seriam duas bolsas para o projeto de extensão de cada unidade e o restante iria para um bolsão em que todas as unidades iam concorrer para aquelas bolsas restantes” explica Isaac.
Como questionamento à quantidade escassa de bolsas, o representante da PROEC explicou que apenas um remanejamento interno não é o suficiente para promover mais apoio aos projetos, mas sim uma pressão externa, tendo em vista que o financiamento federal é insuficiente. “A maior cobrança deve ser direcionada à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) e outros órgãos públicos que garantam um fundo mais estável à extensão”, explica o servidor.
A importância da extensão na universidade
Na visão do professor Nilton José dos Reis, a extensão se torna imprescindível justamente por promover a conexão entre universidade e sociedade: “é um dever que nós temos, devolver à sociedade os conhecimentos adquiridos” nas palavras do docente. Ele trabalha a ideia de que, sem extensão, se produz uma “graduação alienada e uma pesquisa alienante”.
Com o processo de curricularização da extensão universitária, todos os cursos devem implementar, no mínimo, 10% de carga horária a ser realizada pelos estudantes. Tal medida gera diferentes reações a respeito da decisão. Sobre isso, o professor Nilton argumenta sobre a maneira que a extensão tem sido usada apenas como uma ferramenta para cumprir uma carga horária e não se preocupa em atingir a função social das ações.
Professor Nilton José na Magnífica. Foto por Asafh William
“Agora que você tem que aplicar 10% no currículo, nós vemos que a universidade não considera e não respeita a extensão. Como diz a professora Sandra de Deus, hoje a gente vê a extensão e a pesquisa trabalhando contra a extensão. Porque se você colocar, são cerca de 30 mil estudantes aqui dentro da universidade, fazendo extensão de fato, nós temos que mudar radicalmente a universidade, a graduação e a pesquisa.”
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